quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

Three Billboards Outside Ebbing, Missouri: um tratado de humanidade


Quem já a conhecia, tinha de ficar entusiasmado com o registo drasticamente cáustico que o filme anunciava. Tinha tudo para ser uma jóia talhada naquela sua crueza extraordinária e na ostensiva falta de paciência que lhe parece correr nas veias. Se não foi um papel escrito para ela, como é costume dizer, acabou por sê-lo, de uma forma ou de outra. Frances McDormand é tudo o que dela poderíamos esperar, em Three Billboards Outside Ebbing, Missouri. O carácter brutal e brutalmente irresistível define-lhe uma personagem icónica, que marca o nível da temporada e escreve mais uma página de ouro na sua fantástica carreira (já ganhou um Óscar, um Globo de Ouro, um Tony Award e um Emmy, mas façam um favor a vós próprios e vejam um tesouro de minissérie, chamada Olive Kitteridge).

McDormand é, evidentemente, a reserva estilística e moral de um filme que, à sua imagem e semelhança, se escuda na própria rudeza para afastar todos quantos não sejam de confiança, e não queiram perder o tempo suficiente com ele. A olho nu, é uma excelente alegoria negra sobre crime, mas se formos capazes de ver para além disso, é um drama brilhante, uma história abnegada e singela de quem tem de sobreviver de alguma maneira, depois de já ter morrido na morte de outros. A sua incansável travessia no deserto e a inevitabilidade do seu falhanço, mais a maneira como ela se dá a essa derrota de forma tão sonante e espectacular, acabam por ser comoventes e contagiam-nos na mesma medida em que compadecem os que, de forma mais ou menos improvável, acabam por gravitar à sua volta.

Porque se Frances McDormand é a melhor notícia do filme, a segunda melhor notícia é o filme ser ainda maior do que ela. Pelo argumento ambicioso, cru e provocador e pelo que Martin McDonagh (do maravilhoso In Brugges) consegue dar às suas personagens, sem fazer muito caso disso, sem alarido e sem quase chamar à atenção. Three Billboards é um enorme filme, também pela generosidade da narrativa do sempre notável Woody Harrelson e, sobretudo, por aquele que para mim é a revelação do ano e, desde já, o meu favorito ao Óscar de Melhor Actor Secundário. Sam Rockwell faz, garantidamente, a performance da carreira, depois de demasiadas promessas durante demasiado tempo, uma que eu jamais viria chegar, e que a própria acção faz magistralmente questão de guardar.

O filme com o melhor título do ano é um oásis de humor de insulto, é agressivo, às vezes até gratuito, mas jamais presunçoso. É um filme que sabe falar de pessoas, da maneira difícil como são as pessoas, com atos em vez de palavras, com complacência e, acima de tudo, com redenção. É um trago forte, mas é um bálsamo para a alma.

8.5/10

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