domingo, 25 de janeiro de 2015

The Grand Budapest Hotel. O gosto de ir à aventura


Nunca tinha visto Wes Anderson e não era uma prioridade. Ouvira a filmografia peculiar, o humor de autor, a dedicada composição, mas sinceramente não tenho por hábito ficar fã de ninguém muito absorvido e, portanto, a desconfiança era de bom senso. Não teria realmente sido para já não fosse a avalanche de nomeações. A temporada dos prémios é, de resto, tantas vezes perversa, cometendo esquecimentos imperdoáveis e chamando a atenção para quem não a merece de todo. The Grand Budapest Hotel é, no entanto, um feliz exemplo contrário. Carismático, entusiástico, com cor, humor e envolvência, é, na verdade, uma das surpresas mais agradáveis do ano.

É um filme sobre a história de um livro, obra de um velho caminhante que explica, logo nas primeiras linhas, o seu segredo: que os grandes enredos não assomam à mente dos melhores escritores por decreto de uma criatividade permanente; pelo contrário, os melhores são aqueles que conservam, ao longo da vida, a capacidade tão só mundana para olhar e para continuar a escutar atentamente. E, no fim de contas, são as próprias histórias que vão ao seu encontro, não eles que as têm de ir fazer. The Grand Budapest parte da atraente proposta de que a sua crónica, mesmo que de um hotel aparentemente fictício, numa república imaginada, foi, afinal, verídica num tempo e habitada por gente de carne e osso, ainda que já só viva na mente de um velho contador de histórias.

É, no essencial, um relato das venturas e desventuras de um icónico concierge - Monsieur Gustave -, mestre de um estrelar hotel de estância, numa palaciana república centro-europeia da primeira metade do século passado. Acho que o trailer não lhe fazia jus porque, tal como esta descrição, correu o risco de cingi-lo. Ainda que centrado nas quatro paredes do hotel que lhe dá o nome, The Grand Budapest não se reduz, todavia, às peripécias da vida quotidiana com um trago de humor; é um filme largo, que excede definitivamente esse espaço físico, tanto na acção, como no simpático alcance das suas personagens. A história funciona em flashback - começa com um misterioso cavalheiro a versar as suas memórias ao jantar, com o hotel já decadente -, tem passado, enquadramento histórico e tem tanto mais carisma por causa disso. Ganhei, de facto, um franco respeito pelo trabalho de Wes Anderson. Da câmara ao argumento (o travo ácido dos diálogos é uma assinatura deliciosa), é um criador tremendamente coeso, muito elaborado e muito fiel à sua visão, sem nunca ser pretensioso ou cansativo. Pelo contrário, é isso que lhe emprega aura, fazendo com que brote naturalmente um produto colorido, alegre e cativante. The Grand Budapest é um conto puro, uma aventura com personalidade, que acompanhamos a gosto, peripécia a peripécia, com aquela curiosidade que nos costumava mover em crianças.

No plano interpretativo, e por entre um elenco riquíssimo, Ralph Fiennes também sobressai como uma das agradáveis notícias da temporada, num registo bem distante do que está habituado a fazer. A forma engalanada como se comporta, levemente delirante, é teatral, mas acerta em cheio na disposição, e nunca é uma caricatura. Não é o seu registo, não era fácil ser fiável e, no entanto, é uma personagem que se vem a entranhar de bom grado. Muito justa a nomeação ao Globo Musical/Comédia. Destaco, igualmente, as prestações juvenis: Tony Revolori encaixa como uma luva no ritmo acelerado, cómico e conceptual do boneco, tendo sido uma óptima escolha de cast; Saoirse Ronan, nomeada da Academia em 2008, aos 18 anos, já é outra certeza. A óptima presença e a sua graciosidade intensa permitiram-lhe, sem esforço, dominar o papel.

The Grand Budapest Hotel é nada menos do que o digníssimo campeão de nomeações de 2015, somando nove, onde se incluíram Filme, Realizador, Argumento Original e Cinematografia, qualquer uma delas honestamente merecida. Não é um filme inesquecível, mas é prazeroso e, seguramente, um dos mais interessantes do ano.

7/10

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