quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Trouble with the Curve


Tem história, tem carisma, tem personagens, e é absolutamente bem contado.

Trouble with the Curve é o limite da carreira de um histórico scout de baseball, homem difícil, que, enquanto renega a doença que lhe ameaça roubar os últimos dias da profissão, terá de aprender a lidar com a filha que teve de criar sozinho, numa última viagem pelos caminhos da América por onde fez vida, à procura de talentos. Desde logo, o filme esbanja esse ambiente. Esse cheiro da magia do desporto, dos velhos tempos e das rotas dos olheiros. É uma homenagem reverente à tradição, um texto de apaixonado que se vê em todas as pequenas coisas, e que lhe emprega um coração grande, que distingue os melhores filmes dos outros.

Acima de tudo é, porém, uma história notável sobre o desafio da paternidade, sobre querer fazer a coisa certa mas não estar à altura, e falhar a quem nos é mais querido. Uma história sobre sarar feridas e aprender a ser família, na consolidação do laço primordial entre um pai e uma filha. Como segunda narrativa, cabe ainda um romance atraente e saudável, feito com a ligeireza de um flirt bom, que tira peso e dá cor à acção. O grande defeito do filme é que, quando se entusiasma, torna-se lírico demais, o que insufla o romance e lhe tolda, por exemplo, todo o fim. Ainda assim, isso não afecta decisivamente a tremenda qualidade do texto do estreante Randy Brown, secundada por um trabalho impecável atrás da câmara de outro rookie, Robert Lorenz, um antigo Assistente de Realização de Eastwood.

O carisma de Clint Eastwood é indissociável do filme. É um dos monstros com assinatura, e se lhe escreverem um papel, ele exponencia-o até onde isso for possível. É o que acontece aqui. O seu Gus é acido, amargo e agreste, violentamente seco e sarcástico, à semelhança de muitos outros dos seus papéis, mas a chapa é tão boa, e sai-lhe tudo tão natural, que não há nada para pôr em questão. Ao mesmo tempo, e até com o mesmo desalento e a mesma indignação, e do alto dos seus gloriosos 82 anos, Eastwood ainda consegue ser comovente, no homem incapaz de criar a sua menina, que "fez o melhor que sabia", e que preferiu afastá-la, só para que não a pudesse magoar. Se a carreira como realizador já viu melhores dias, bem-dito seja o regresso de alguém deste tamanho aos ecrãs (quatro anos depois do também excelente Gran Torino).

Amy Adams continua a acumular grandes papéis. Com 3 nomeações aos Óscares nos últimos 6 anos!, dá, em Trouble with the Curve, mais uma mostra da sua extrema versatilidade, a conjugar o jeito casual de girl next door, a energia rebelde de uma miúda que cresceu nos circuitos de baseball com o pai, e que sabe tudo sobre o jogo, e as profundas marcas deixadas pela sua infância disfuncional. Todas as contra-cenas com Eastwood têm uma pessoalidade muito grande, e sem esse excelente encaixe entre os dois o filme não poderia ter resultado. Finalmente, Timberlake empresta tudo o que se lhe pedia. É bem disposto, carismático e tem uma naturalidade com a câmara. Dá gozo e dá cor ao romance, e assenta perfeitamente no papel.

As críticas têm sido francamente más, mas isso é coisa que me ultrapassa. Trouble with the Curve não é inovador na fórmula, não é trágico, e é lírico de vez em quando, mas tem ambiente, um carisma farto, uma humanidade indiscutível, um romance saboroso, e excelentes personagens, e é, sem dúvidas, um dos grandes filmes de 2012.

8/10

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