terça-feira, 4 de dezembro de 2012

"A critical favorite, commercial blockbuster and cultural phenomenon"


Há consensos que não se afectam. A lenda Seinfeld, considerada em 2002, pela TV Guide, como o melhor programa televisivo de todos os tempos, é obviamente um deles.

A mãe das sitcoms, que se tornou num verdadeiro ícone da cultura televisiva americana na década de 90 (9 temporadas, 1990-1998), foi criada pelo próprio Jerry Seinfeld, em parceria com outro monstro, Larry David (Curb Your Enthusiasm). Seinfeld interpreta, como depois nos habituamos a ver, uma versão ficcionada de si próprio, e, basicamente, a série segue a sua vida de trintão em Nova Iorque, sempre ao lado do melhor amigo, da ex-namorada e do vizinho da frente.

O texto é absolutamente de outro mundo. Não apenas nos temas, no talento brilhante com que se lê e retrata as situações do quotidiano e na caracterização das personagens, mas muito especialmente nos pormenores. Todos os episódios são um manancial de princípio a fim, cheio de detalhes, ideias e saídas deliciosas, tão genuínas que parecem improvisadas, coisa de quem tem um brilho e uma piada verdadeira em tudo o que faz. Esse carisma é tão palpável, que contagia a série a tempo inteiro.

Se calhar agora até se estranha, porque a comédia não é "hardcore" como nos habituamos a ver nos últimos anos (Gervais, Louis C.K.). Tem, por sua vez, uma classe e uma luz próprias dos velhos tempos, que cativam absolutamente. Não tem sexo, agressão, preconceitos, acidez, mas não tem nada de banal. É uma sitcom de ideias e de humor puro, genial e actual na recriação das relações e do dia-a-dia, sempre entusiasta e nada pretensiosa, no sentido em que a ideia daquilo nunca é dar lições, mas tão simplesmente viver, e rir disso o mais possível.

Jerry Seinfeld tem um carisma imenso, que contamina a série de forma indissociável. É o pivot de tudo, sem forçar, sem conter o riso uma e outra vez, chegando-lhe ser um natural. Julia Louis-Dreyfus (Elaine) é a melhor lead comédia que já vi. Beneficiando também do relaxamento da série, é um mimo vê-la com ar de miúda, ora entusiástica e acelerada, ora de ar gozão na cara, com um certo swag, mesmo nos roupões dos 90s. Jason Alexander é o melhor texto e a melhor interpretação. O seu George Costanza, o melhor amigo de Seinfeld, é brilhante na psicose atómica, sempre desesperado a correr atrás de qualquer coisa, fatalista e a dar cabeçadas. Finalmente Michael Richards, o grande Kramer, é o bom gigante, alheado e non sense, feito de ideias mirabolantes e de pouco tacto.

A realização é feliz na conjugação da acção e do stand-up real de Seinfeld, e extremamente homogénea a ligar os temas, fazendo com que toda a composição brote naturalmente. É, sem dúvida, outra das razões do sucesso.

Seinfeld é tão maduro, carismático e saudável que devia andar há um quarto de século num loop de serviço público pelas televisões desse mundo fora.

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