quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Argo


A primeira grande desilusão do ano.

Para mim, era um dos 10 mais esperados de 2012. A história verídica do resgate de 6 funcionários da embaixada americana em Teerão, aquando da Revolução Islâmica, em 1979, era uma pérola, Affleck cada vez mais fazia carreira na realização, e o elenco era nada menos do que majestoso. Argo parecia um daqueles filmes que se fazem sozinhos.

Não foi. Numa reconstituição histórica, não há escape criativo, tem de se jogar com o que há. É indispensável ser inteligente, subtil, saber exactamente que pontos valem a pena ser pressionados. Não vai acontecer nada de surpreendente, portanto, na analogia ao poker, é preciso ganhar o pote sem a melhor mão, usar bluff. O bluff, em Argo, é de uma infelicidade quase constrangedora. 2/3 do filme são competentes, bem executados. Não tinham muito que explorar, mas são interessantes, preparando o caminho para o que teria de vir a seguir. E a seguir teria de vir um corolário inteligente, executado com tanta tensão quanto classe.

O que veio a seguir foram cenas de suspense de 3ª categoria. Um thrill bacoco, arrancado aos filmes rascas de acção que vão directos para o DVD. O telefone que é atendido no último suspiro, o autocarro que não arranca, os bilhetes que não estão no sistema, milícias que descobrem a verdade no último minuto... Enfim, numa história cujo fim se sabe, só funcionaria um argumento elegante, nunca um contra-relógio de clichés. Na verdade, Argo parece em quase tudo uma boa história "jornalística" mal idealizada para o ecrã: os reféns, por exemplo, são secundários quase vegetais na história, o que é contra-natura, e falta fluidez à alternância dos diferentes momentos da acção que é, não raras vezes, abrupta. Na primeira adaptação de argumento que fez, Chris Terrio (um realizador-argumentista nova-iorquino de 36 anos, sem grande expressão) não foi manifestamente feliz: Argo é dos piores argumentos que me lembro de ver num filme deste nível.

Affleck faz uma realização interessante, apesar de tudo, e de não ser a melhor que já fez. A capacidade, a leitura e as boas ideias estão lá, são uma mais-valia e garantem boas sequências, mas ainda não é desta que se candidata ao Óscar. Como protagonista, já não. Tony Mendez é um papel que exigia bastante mais nervo e personalidade, e Affleck nunca convence, também por vias do argumento, que não é capaz de fazê-lo mais denso. A linha do seu divórcio e do filho de 10 anos é só mais uma construção vulgar, pregada a fita-cola, sem qualquer empatia.

Os melhores do cast foram John Goodman e, necessariamente, o extraordinário Alan Arkin, ambos no registo bem disposto e mundano de hollywood (o que não abonará muito por um thriller histórico). Elogie-se, também, a boa banda sonora e a óptima reconstituição histórica, desde a edição, ao visual das personagens e ao vasto material de época utilizado.

Argo é uma história que tinha de ser um filme, assassinada por uma péssima adaptação de argumento, que transforma condições muito favoráveis, num filme meramente razoável.

6/10

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