segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

O louco


José Manuel Coelho sempre foi uma figura difícil de se levar a sério. A própria entrada na cena política madeirense, tão habituada aos brandos costumes, a comer e a calar do regime, rondou a violência para quase todos: uma bandeira nazi é muito fácil de se levar a mal, e ainda mais de descredibilizar à nascença ideias boas. Mesmo que sempre por caminhos tortuosos, o Coelho resistiu a isso. E o sarcasmo, a agressividade, o ácido e o exagero, tornaram-no, nos últimos anos, pura e simplesmente, na única verdadeira forma de oposição na Madeira. Sempre presente, sempre despudorado nos nomes e nas acusações, sempre sem contemporizar, é a única personalidade política que vi irritar o regime nestes anos todos. Antes, a oposição era só um brado envergonhado nas discussões comezinhas. Só com ele e com o seu estapafúrdio, e com as bandeiras, os relógios ao pescoço, os dirigíveis no Chão da Lagoa, os boicotes às inaugurações, e a denúncia a frio, é que surgiram a espinha e os princípios.

Não deixa, por isso, de dar que pensar, quando, na 6ª-feira, uma empertigada Judite Sousa, sempre tão mansa quando o entrevistado é um peixe graúdo, quase bradou aos céus com a suposta falta de seriedade da campanha e da forma de fazer política do Coelho. E com a sua falta de coerência, do Partido Comunista ao PND, e com a obsessão com Alberto João Jardim, sem o qual não seria nada, e com a sua ligação às famílias alheias ao jardinismo. Judite Sousa é muito importante para compreender que casos extraordinários exigem medidas extraordinárias, e que, no caso da Madeira, só um louco, sem nada a perder, sem limites, poderia contribuir com alguma coisa. O choque genuíno e a agressividade de boca cheia do vulto a quem os políticos supostamente se explicam ao país, foi só um espectáculo triste, de quem não é capaz de enxergar que política é muito mais do que Esquerda ou Direita, do que formalismos ou do que o politicamente correcto.

Claro que o Coelho não é nenhum profeta, que não é um santo ou um salvador, e que provavelmente tem os seus interesses, ou é levado por este ou por aquele, e que talvez nunca seria capaz de assumir e governar. Mas no seu irreprimível devaneio, sobrevive a consciência de que, independente a tudo, ainda é possível chegar-se à frente e denunciar a máquina. Não há seriedade maior do que essa.

1 comentário:

Alícia Abreu disse...

Uma apreciação perfeita ao homem que diz ter uma visão de futuro e se intitula como uma réplica fiel de José Mourinho. Parabéns pelo texto extremamente bem escrito, digno de um óptimo jornalista!