sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Tu eras o herói, Son Goku


Sinceramente, não consigo ter noção das horas que passei a ver Dragonball. Devo ter visto as séries todas algumas 3 ou 4 vezes, no tempo em que o Bueréré era uma religião, comprei e lidei com quantidades massivas de cromos, às centenas mesmo, quando a Panini ainda era uma instituição, tive bonecos, desenhos, tudo, tudo. Se há alguma coisa que marcou verdadeiramente a minha geração, essa foi, sem sombra de dúvidas, o Dragonball.

Apesar de preconceitos raramente me impedirem de ver seja o que for, não posso dizer que não sabia, à partida, que este Dragonball: Evolution ia ser um desastre. Não ia deixar de ver por mim, claro, quanto mais não fosse quase por um questão de respeito, mas toda a gente não podia estar enganada. E não me surpreendi, realmente. Este Dragonball é uma anedota. Podia ser só mau, ter maus efeitos especiais, ter uma história parvalhona de acção, seca, mal interpretada, ter feito más opções de cast. Mas não, é muito pior que isso.

O pior de tudo são os clichés. Nunca vi nada assim. Este Son Goku é um Son Goku moderno, um miúdo do Secundário, o que já de si é uma aberração e um atentado à essência do Dragonball, mas a coisa é mais refinada, consegue ser uma matrioshki de estupidez: ele não só é um miúdo de Secundário, como é o miúdo-de-secundário-totó-que-gosta-da-namorada-linda-do-gajo-grande-e-mau-que-o-goza-a-toda-hora. Familiar? Não faltam, depois, as frases de último fôlego, os conselhos no leito de morte, os "nunca te esqueças de quem és", isto na secção melodramática, porque na do amor temos os momentos Bulma-Yamcha, com coisas fofas como "é bom saber disso no dia antes do fim do mundo", ou o Son Goku a aprender em segundos a técnica basilar da série... porque a Kika lhe prometeu uns amassos.

As personagens são, também elas, miseráveis. A suposta Kika (pelo menos não me lembro do Son Goku se agarrar a mais ninguém) é deslumbrante, mas deve ter resultado dalgum exercício para encontrar o completo oposto do que a personagem devia ser, o Yamcha é só rasca, o Son Goku é aparvalhado, a concubina do Satã ainda não percebi o que foi, o boneco do Satão dispensou uma vista de olhos pelo boneco da série, e esqueceram-se do Tartaruga Genial para pôr lá um palhaço (é, talvez, a pior personagem de todas). Só sobrevive a Bulma, talvez fruto da maior rodagem da Emmy Rossum (The Day After Tomorrow, Mystic River, Poseidon), a fazer uma intepretação minimamente legítima para com a personagem, com as míticas cápsulas que se transformavam em coisas mesmo grandes e úteis e o radar das bolas de cristal (apesar deste estar mais para GPS). O que não salva o filme, como é óbvio.

Num filme que tem pouco mais de uma hora e um quarto, acabou por ser também inevitável o vazio retundo no fio da história, cujo corolário, piadas asneironas à parte, é empacotar o Satã em 2 segundos, como se isso fosse uma brincadeira de crianças. Não faltaram, ainda, uma cena à filme asiático maluco (que acaba com uma mosca na boca de alguém) e uma sequência nada mais nada menos do que made in Senhor dos Anéis, desde bolas de cristal em que se vê o futuro e o gajo mau até Uruk-hais à moda do Dragonball, a aparecerem num caminho meio manhoso para um montanha com lava. Só faltou o Gollum, a dizer que sempre em frente e chegavam a Mordor.

Enfim, há coisas que nunca vou perceber, e esta é uma delas: como é que alguém fez isto a um Dragonball?

1 comentário:

Aline disse...

Não vi o filme, mas emocionei-me com o texto. Estou chocada, achincalharam todo o MITO que é a série. RIP Dragon Ball (L)